A Comissão Pastoral da Terra dentre os novos movimentos sociais durante o Regime Militar brasileiro (1978 - 1983).

      https://dialogoshistoricos.wordpress.com/historia/brasil-anos-60-e-70/


Na presente postagem, para melhor compreensão da nossa abordagem e recorte, vamos contextualizar o período e o tema. Posteriormente, vamos apresentar os três aspectos que consideramos fundamentais nos estudos desse período (o Regime Militar, de 1964 a1985), e discursaremos sobre um aspecto escolhido como principal. Assim, dedicamo-nos a apresentar algumas características da sociedade brasileira entre 1978 e 1983, principalmente o que se pode perceber no processo do campo e da cidade que contribuíram para a formação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Por base, usaremos o texto Quando novos personagens entram em cena (SADER, 1988) e o texto Querência do Norte no contexto de luta pela reforma agrária: narrativas do assentamento Pontal do Tigre (AUGUSTO; ROCHA; ROMPATTO, 2021).

Por Gabriel Rocha.

https://www.cnbbo2.org.br/organismos/cpt/

          Compreendendo o Regime Militar em três períodos, sendo eles: de 1964 a 1968, momento em qual acontece a consolidação da ditadura como um novo regime de governo, por dos atos institucionais e pelos atos complementares baixados; de 1969 a 1979, quando período considerado como anos de chumbo (1968 – 1973) com o endurecimento da ditadura e fechamento do regime, observando que entre 1977 e 1979 começa um processo de enfraquecimento, que em 1978 fica evidente; e de 1979 a 1985, que marca o aprofundamento da crise no Regime Militar, demonstrada nos setores econômicos e políticos, dando espaço para os novos personagens e, por fim, à transição. Daremos ênfase ao período que vai de 1979 a 1985.

          Na década de 1970, antes da crise no regime se tornar política, ela foi uma crise econômica. Os anos do chamado Milagre Econômico, que se deu por fatores internos e externos, haviam passado. Então, mesmo que a violência e a repressão estivessem sido aumentadas substancialmente entre 1968 e 1973, o PIB havia crescido 11%, mas a partir de 1973, com aumentando em 1974, esse modelo de crescimento econômico entrou em crise. Em 1973, tem-se a chamada 1ª crise do petróleo, demonstrando que o Brasil era extremamente subordinado à essa cadeia. Com essa crise, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP), decidiu diminuir a oferta de petróleo no mundo para poder aumentar o preço, atingindo a economia global com a hiperinflação. Desse modo, a combinação da hiperinflação, o aumento da dívida externa em dólares e a recessão do mercado interno fez o desemprego aumentar substancialmente em 1974.

https://historianews21.blogspot.com/2013/08/crise-do-petroleo-1973.html

Já em 1979, tem-se a 2ª crise do petróleo, em decorrência da Revolução Iraniana, aprofundando a crise vinda desde 1973. Em 1978, saiu uma matéria jornalística demonstrando que o governo fraudava, desde 1977, os dados da inflação, não oferendo uma reposição inflacionária no salário dos trabalhadores. Nesse contexto ainda ocorrem as mortes de Vladimir Harzog e Manoel Fiel Filho, influenciando no ânimo da população já afetada pela inflação e salários corroídos, resultando numa reação da sociedade civil. Percebe-se, assim, que a crise econômica no Brasil gera uma crise política dentro do próprio regime, que somadas derivam nos novos movimentos sociais, os novos personagens em cena.

Jornalista Vladimir Harzog
      (https://www.bemparana.com.br/noticias/brasil/morte-do-jornalista-vladimir-herzog-completa-45-anos-relembre/)

Operário Manoel  Fiel Filho
       (https://metalurgicos.org.br/noticias/ha-40-anos-ditadura-assassinava-o-operario-manoel-fiel-filho/)

Os três elementos/aspectos que destacamos, portanto, como fundamentais na pesquisa do Regime Militar, são: o caráter violento/repressivo assumido no decurso do Regime, as crises econômicas que afetam o governo (destaque para 1ª e 2ª crises do petróleo) e a presença da Teologia da Libertação nos novos movimentos, que surgiram no final de 1970, principalmente na relação da Comissão Pastoral da Terra (CPT) com o surgimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Desenvolveremos o último elemento mencionado a seguir.

    https://kn.org.br/periodicos/theologia-publica/theologiapublica-teologia-da-libertacao-no-brasil/6018

Os movimentos sociais desse período demonstram a diversidade dos novos seguimentos das classes sociais: eram vários movimentos, mas possuíam uma mesma direção, ligados por uma perspectiva de classe social, representando a luta do operariado/proletariado e do trabalhador assalariado. Conforme o Regime foi se intensificando em direção à crise, esses movimentos foram tomando força. As classes populares estavam, portanto, representadas por esses movimentos. A característica forte deles é a presença da Igreja Católica, representada pela Teologia da Libertação, composta por setores progressistas, numa ideia de Igreja preocupada com o pobre, com a pregação do evangelho acompanhada de luta e consciência política.

Anteriormente ao Regime Militar (1964 - 1985), as Ligas Camponesas explicitavam o problema de terra que se tinha no Brasil. Com o avanço industrial do período de JK, teve-se o aumento da concentração de terras com o agronegócio no campo. A Ditadura Militar sufocou esses movimentos no campo, com fechamento do regime. Além disso, o Milagre Econômico contribui com os grilos de terra, somados às construções das Usinas Hidrelétricas na década de 1970. Com a crise econômica, surgem os novos movimentos sociais trazendo consigo o movimento dos posseiros, dos assalariados no campo, os cortadores de cana, os boias-frias, os sindicatos rurais, etc, alinhados aos moradores da cidade que estavam desempregados e queriam tentar a vida no campo. Nessa conjuntura, destaca-se a presença da Teologia da Libertação, representada principalmente através da Comissão Pastoral da Terra.

                                     https://bemblogado.com.br/site/galileia-e-a-luta-para-preservar-a-historia-das-ligas-camponesas/

                                                        https://www.novacultura.info/post/2022/01/26/ligas-camponesas-do-brasil

Na gênese do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra temos a presença de lideranças religiosas que estimulam e incentivaram a organização dos trabalhadores para lutarem pelos seus direitos. Tais lideranças, no campo e nas cidades, apoiados também pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e em parte pela Igreja Luterana, a Comissão Pastoral da Terra começa a incentivar que os camponeses se organizem e lutem por terra. Essa pastoral teve uma importante participação no início da criação do movimento sem-terra, sendo o “braço direito” no seu surgimento.

                                        http://memorialdademocracia.com.br/card/bispos-do-brasil-contestam-a-ditadura

Era a Comissão Pastoral da Terra quem dava o suporte com todo tipo de assessoria, informação, assessoria jurídica e na organização do próprio movimento, até que o mesmo tivesse a estrutura para sozinho caminhar. Isso não foi um processo longo porque trabalhavam direto com várias formações e frentes de formações. Inclusive na assessoria para se organizar os primeiros congressos, a Comissão Pastoral da Terra estava junto com eles. A relação entre a CPT e os trabalhadores sem-terra serviu de impulso e amparo na criação do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Os cursos organizados pela CPT visavam o aprimoramento pessoal daqueles que estavam envolvidos na luta, para que pudessem se defender de ataques vindouros e perceber o momento econômico, social e político do país e, também, quem eram os seus oponentes, ou seja, com quem estavam lutando.

                                             https://cptnacional.org.br/quem-somos/82-noticias/cpt-40-anos/2645-cpt-40-anos-caminhando-com-o-povo-da-terra

                                    https://www.cptnacional.org.br/publicacoes/noticias/cpt/4402-cpt-ne-2-celebra-30-anos-de-vida-em-defesa-dos-povos-da-terra

O (MST) nasceu oficialmente em 1984, no 1º Encontro Nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, ocorrido em Cascavel, no Paraná, entre os dias 20 e 22 de janeiro, tendo a participação e o apoio da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e de alguns sindicatos de trabalhadores rurais, herdeiros de lutas pela terra no Brasil. A Comissão Pastoral da Terra (CPT) de Maringá-PR teve uma importante participação no processo de organização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, em seus primeiros passos, no início do processo de ocupação do latifúndio improdutivo na região Noroeste do Paraná. A CPT era quem dava orientações teóricas e práticas municiando o movimento de estratégias para o processo de acampamento e ocupação do latifúndio improdutivo. Ao mesmo tempo a CPT dava cursos de orientação jurídica para o movimento defender-se dos ataques ou das reações da justiça a serviço dos fazendeiros, como solicitar habeas corpus em caso de prisão e etc.

               https://www.dmtemdebate.com.br/21-de-janeiro-de-1984-tem-inicio-o-1-encontro-nacional-dos-trabalhadores-rurais-sem-terra-marco-na-fundacao-do-mst/



Referências: 

SADER, Eder. Quando novos personagens entraram em cena: experiências, falas e lutas dos              trabalhadores da Grande São Paulo, 1970-80. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 4ª edição 2001.

ROMPATTO, Maurílio; AUGUSTO, Mariana de Barros; ROCHA; Denilton Gabriel Ambrosio da. Querência do Norte no contexto de luta pela reforma agrária: narrativas do assentamento Pontal do Tigre. In: ROMPATTO, Maurílio; CRESTANI, Leandro de Araújo (ORG). Territorialidades camponesas no Noroeste do Paraná. Cascavel: Editora FAG, 2021.

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